Com o coração apertado, Anna Carla, dona da marca Bom Paladar Alimentos, deixou o filho de quatro meses em casa para participar do lançamento do projeto Mulheres no Varejo, promovido pelo Sebrae Alagoas. A aflição da empresária é o desafio que milhares de mulheres brasileiras enfrentam todos os dias: equilibrar a maternidade e a difícil rotina de quem empreende no varejo.
“Estou desde cedo resolvendo problemas da empresa e não consegui voltar para casa antes de vir para cá. Meu filho vai dormir sem me ver. E hoje existe uma cobrança muito grande em cima da mulher que trabalha, que tem menos tempo pra casa. Essa cobrança é injusta, mas eu resolvi enfrentar porque quero continuar a construir a minha vida, ser mãe e empresária sem culpa”, desabafa a empresária, que comanda a indústria e distribuição de produtos naturais, ervas, temperos e especiarias da sua empresa. Ainda assim, ela sente na pele a discriminação de gênero no meio empresarial.
“O mercado de trabalho é cruel com a mulher e o varejo consegue ser ainda pior. A gente é vista sempre como filha ou como esposa de alguém, como se não tivesse capacidade de liderar um negócio sozinha. Para ter uma ideia, dos mil clientes que tenho, só trinta são mulheres que estão à frente dos negócios. Então, o Mulheres no Varejo chega na hora certa para empoderar e mostrar que a gente pode estar no comando”, completou.
Assim como Anna Carla, outras mulheres também estiveram presentes no lançamento do projeto, como a empresária de Penedo Tatiane Nascimento, fundadora da Coco Bom. Ela viajou 150 quilômetros para iniciar uma nova jornada com o Mulheres no Varejo. “Desde o início da minha empresa, o Sebrae está comigo e me apoia em cada etapa. Estar aqui hoje com outras mulheres é uma oportunidade única. É nesse tipo de ambiente que surgem ideias e parcerias que podem mudar o rumo dos negócios”, afirma a empresária, que começa a expandir a atuação da sua empresa para a capital alagoana.
Projeto compreende dores e constrói soluções colaborativas
No Brasil, a maioria dos lares é chefiada por mulheres. Segundo pesquisa do IBGE de 2023, 40,2 milhões de famílias no país são chefiadas por mulheres, enquanto 37,5 milhões, por homens. E cada vez mais o empreendedorismo têm sido a opção delas para levar sustento e melhoria nas condições da família. Segundo a Junta Comercial de Alagoas (Juceal), mais de 96 mil empresas são chefiadas por mulheres no estado, número que cresceu quase 16% no último ano.
A equidade de gênero nos negócios, no entanto, ainda está longe de se tornar realidade. A desigualdade de renda, acúmulo de responsabilidades domésticas e a falta de tempo para capacitação são algumas das dificuldades enfrentadas pela maioria das mulheres que decidem seguir o rumo do empreendedorismo. E é justamente nestas dores que o Mulheres no Varejo quer impactar, buscando a autonomia das microempreendedoras e empresárias, como explica a analista Agda França, gestora do projeto.
“Durante uma missão empresarial com mulheres do setor de alimentos e bebidas em São Paulo percebemos que elas enfrentam desafios semelhantes, como dificuldade em separar finanças pessoais das empresariais, sobrecarga com a gestão do tempo, liderança fragilizada devido inseguranças e carência de apoio técnico. A partir da identificação dessas dores, construímos o projeto Mulheres no Varejo de forma colaborativa, construindo uma trilha de capacitação prática e focada em resultados “, destacou.
Para esta primeira edição, voltada para o setor de alimentos e bebidas, foram selecionadas 40 mulheres que irão participar de encontros presenciais e virtuais, além de mentorias individuais, que irão tratar de temas relacionados à finanças, gestão de pessoas e lideranças, inovação, marketing e produtividade.
“É um programa feito para elas e com elas. O Sebrae entra com as ferramentas, mas o que dá sentido são as próprias empreendedoras. E mesmo quem não conseguir participar desta edição, poderá sempre acessar outros produtos da casa. Estamos sempre com as portas abertas para acolher e fortalecer o protagonismo feminino no varejo”, reforça a analista.

Liderança feminina e inteligência relacional em discussão
No lançamento do programa, ocorrido no início da semana, as participantes do projeto assistiram uma palestra sobre o desenvolvimento da inteligência relacional, apresentada pela consultora Lucineide dos Santos, especialista em gestão de pessoas.
“As mulheres precisam melhorar sua capacidade de relacionamento com suas equipes, com os clientes e consigo mesmas. A liderança feminina tem características próprias, que não devem ser apagadas; pelo contrário, devem ser potencializadas e lideradas. É aí que entra a inteligência relacional, que é a capacidade de criar conexões genuínas, de compreender as emoções do outro e de liderar com empatia e propósito”, explica.
A valorização da liderança feminina, de acordo com ela, passa também pelo autoconhecimento e autocuidado. “Ela não necessita aprender apenas a delegar tarefas ou ler relatórios. Precisa também olhar para dentro de si, compreender seus próprios limites e desenvolver ferramentas emocionais que permitam liderar sem se anular. A gente quer mostrar que é possível crescer com equilíbrio, com rede de apoio e estratégia”, reforçou.

