Agência Sebrae de Notícias

Em um primeiro momento, o brinquedo sensorial feito de material reciclado e um complexo algoritmo de inteligência artificial parecem habitar mundos opostos. De um lado, a técnica do “faça você mesmo”, onde tesoura e cola transformam a vida de crianças atípicas no chão de casa. Do outro, a precisão dos códigos operando na nuvem para revolucionar empresas.

Apesar de muito diferentes, a inovação de impacto das duas startups ultrapassaram as fronteiras de Alagoas e foram selecionadas para um dos programas de aceleração mais concorridos do país, o BNDES Garagem. A Mãeduca e a Inspíria venceram uma seleção com mais de 1.800 startups e, além de integrar o Top100 do programa, reforça o posicionamento do ecossistema de Alagoas na elite do empreendedorismo nacional.

Transformando a dor em propósito: o case Mãeduca

A história da Mãeduca não começou como uma ideia de negócio em um escritório envidraçado ou em um coworking descolado. O início foi no chão da sala de uma família em Arapiraca, em meio a garrafas PET, caixas de ovos e uma aflição comum a muitos pais durante a pandemia: como estimular o desenvolvimento de um filho pequeno sem acesso à escola ou terapias presenciais?

Monique e Rafael Melo buscaram na internet atividades para ajudar o pequeno Álvaro, e ao descobrir a metodologia Montessori perceberam que tinham em casa os materiais necessários para criar brinquedos sensoriais, que promovem funções cognitivas e desenvolvimento motor e emocional. Os resultados passaram a ser compartilhados de forma despretensiosa no Instagram, que cresceu rápido, principalmente entre mães e profissionais, e conseguiu até furar a bolha da internet e chegar à TV Globo.

Um vídeo que mostra Álvaro montando um tetris com caixa de ovos foi tema de matéria no programa Mais Você, da Ana Maria Braga. O vídeo ganhou mais de 15 milhões de visualizações e o perfil do Instagram hoje conta com 195 mil seguidores, onde cerca de 90% deles são mães, terapeutas e professoras, que utilizam as atividades como recurso terapêutico ou educacional.

Após o programa, Rafael e Monique perceberam que as atividades eram muito mais que brincadeira, mas foi apenas após participar de um evento voltado para o ecossistema de startup promovido pelo Sebrae, que perceberam que o engajamento nas redes sociais era uma excelente oportunidade de negócio. “Começamos em casa, com a nossa experiência e materiais acessíveis. É muito gratificante saber que ajudamos muitas famílias, mas nosso maior sucesso foi com nosso filho”, conta Monique.

Assim nasceu a Mãeduca, plataforma que une o carinho da criação do primeiro brinquedo com caixa de ovos à precisão tecnológica. Com o desenvolvimento da IA Ami – amar em esperanto – a plataforma reúne uma série de ferramentas, com o objetivo de conectar família, escola e clínica para o desenvolvimento de pessoas atípicas. O aplicativo, que tem mais de mil downloads, oferece mais de 900 atividades que podem ser feitas em casa, além de reunir outras ferramentas, facilitando desde a anamnese terapêutica e a gestão financeira de clínicas.

Rafael Melo afirma que a proposta do Mãeduca é eficiente porque as famílias de crianças atípicas estão conscientes de que têm um papel fundamental no desenvolvimento dos filhos. “O acompanhamento e as terapias são muito importantes, mas 60% do desenvolvimento das crianças está nas mãos dos pais. Sem o estímulo dentro de casa, a evolução é muito mais lenta”, explica.

Para Monique, a startup é também um ponto de virada na sua vida acadêmica. Ela desistiu de fazer nutrição e agora está concluindo o curso de pedagogia, com planos de especialização na área, totalmente integrada à causa. Tanto que também aplica as atividades terapêuticas à caçula, Helena, mesmo antes de ela completar um ano de vida. “As atividades trazem benefícios para as crianças atípicas, mas podem ser aplicadas para todas as crianças, porque ajudam na autonomia no desenvolvimento motor e emocional”, ressalta.

Inspíria: inteligência artificial made in Nordeste

Enquanto o mundo inteiro corre para entender e aplicar a inteligência artificial aos seus negócios, uma equipe de Alagoas domina a tecnologia. A Inspíria, “inspiração com IA” nasceu da expertise da Weni, uma das principais empresas de tecnologia de Alagoas.

Ao invés de soluções genéricas, a startup cria agentes inteligentes e chatbots avançados para resolver problemas reais. Seja automatizando o atendimento de uma empresa privada ou ampliando o alcance de uma iniciativa social. “A Inspíria surgiu do desejo forte de unir a auto realização, que vem de trabalhar com engajamento cívico e impactar a vida de milhares de pessoas. Nós somos apaixonados por isso”, revela Monique Veronese, líder da startup.

Atualmente, o time é formado por 14 profissionais, a maioria deles se divide entre Alagoas, Ceará e Pernambuco, mas com colaborador também em São Paulo. É tecnologia made in Nordeste sendo exportada para o país, agora com a chancela do BNDES Garagem.

Selecionada para a trilha Tração, voltada para startups que já faturam e precisam escalar, estar no programa é a prova de que é possível fazer tecnologia fora do eixo Sul-Sudeste, além de colocar a startup sob os holofotes, possibilitando acesso a uma forte rede de mentores, investidores e parceiros, suporte para o aprimoramento do produto e escalada do negócio, além de abrir possibilidades para a participação de eventos, matchmarking e formações que fortalecem o posicionamento no mercado.

“Estamos vivendo um sonho mesmo”, confessa Monique. “O programa ajuda a acelerar justamente o que mais buscamos: levar tecnologia acessível e segura para resolver problemas reais de comunicação, atendimento e inclusão digital, impactando vidas com a tecnologia”, completa.

“Empurrão” em direção ao topo

O BNDES Garagem é um dos programas de aceleração mais robustos da América Latina, desenhado para impulsionar negócios que resolvem desafios da sociedade por meio da inovação. Para ser selecionada, a startup precisa mais do que uma boa ideia. Preparo, validação de mercado e maturidade empresarial estão entre os requisitos usados na peneira de 1.800 inscritos e chegar ao grupo de cem selecionados. E a Mãeduca e Inspíria não chegaram lá sozinhas.

Para a Inspíria, o Sebrae atuou como primeiro “investidor de confiança”, antes mesmo de ter seu potencial notado no mercado. “Eles foram os primeiros a acreditar na gente”, relembra Monique Veronese. A empreendedora destaca que a instituição funcionou como uma ponte vital para o crescimento. “Tivemos apoio direto em aceleração, visibilidade e fomento. Inclusive, a participação em feiras abriu portas para novos contratos. Hoje, continuamos próximos, contando com o Sebrae como parceiro estratégico na nossa expansão”, afirma.

Já para a Mãeduca, o Sebrae foi responsável pela própria descoberta da identidade do negócio. Rafael Melo é enfático ao dizer que, antes desse contato, a família sequer se enxergava como uma startup. “A gente foi por curiosidade e conheceu todo esse universo. Hoje, acreditamos que a Mãeduca só é possível graças a todo o suporte que o Sebrae nos dá, seja através dos agentes locais ou da equipe técnica”, reconhece Rafael, destacando que a orientação transformou um projeto caseiro em uma empresa estruturada.

Áurea Andrade, analista do Sebrae Alagoas, vê a seleção das duas startups como um divisor de águas para o estado. “Essa conquista coloca Alagoas no mapa nacional do empreendedorismo de impacto. É um reconhecimento do talento regional e um impulso essencial para fortalecer a inovação no Nordeste”, avalia.

Segundo a analista, o resultado está diretamente ligado às orientações estratégicas, capacitações e conexões de mercado que preparam essas empresas para conquistar o mercado.

O sucesso de Rafael, Monique Melo e Monique Veronese reflete um movimento maior de amadurecimento do cenário econômico local. O Sebrae não apenas aponta o caminho, mas está junto na jornada, apoiando e oferecendo as ferramentas para que elas alcancem resultados concretos. O resultado disso pode ser traduzido em números. Em 2025, as startups que receberam apoio do Sebrae registraram uma média de aumento de faturamento de 123%. É a prova definitiva de que, quando a criatividade alagoana encontra a metodologia certa, o crescimento vira estatística de sucesso.