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Empreendedora aposta na gastronomia afro-brasileira para alcançar sucesso em Maceió 

Na Semana da Mulher, conheça a trajetória da chef Ivanilda Luz, dona de um restaurante que celebra sua ancestralidade
Por Guilherme Lamenha
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Além do sol e do mar, o turismo de Alagoas conta com a excelência gastronômica para atrair um número cada vez maior de visitantes. Ainda que o destaque seja a culinária regional, em Maceió é possível encontrar restaurantes de comida italiana, japonesa, peruana, chinesa, argentina, entre outras. No meio dessa Babel de sabores, o restaurante Odara se destaca com sua cozinha afro-brasileira e uma história de sucesso inspiradora.

O tempero, o atendimento e os preços acessíveis são os diferenciais da chef Ivanilda Luz, que recebe os clientes com um sorriso no rosto e muita história para contar. “A minha trajetória dentro da alimentação nasceu nos terreiros do candomblé, por isso digo que o meu caminho está diretamente ligado à ancestralidade”, afirma.

Ivanilda Luz faz questão de ressaltar que a trilha na gastronomia não é nada fácil, mas a luta é necessária na busca de uma maior visibilidade e valorização. “Eu buscava essa ressignificação da minha história dentro do ramo e decidi lutar pelo que acredito”, completa.

A chef conta que a mãe é uma mulher batalhadora, que sempre trabalhou com comércio. “Ela vende de tudo e faz isso muito bem. Eu fui CLT durante muito tempo, atuando em outros restaurantes, mas eu sempre quis ter o meu, sempre quis ter o meu próprio negócio”, diz.

Depois dos 30 anos, ela começou a entender o que precisava para dar uma guinada na vida profissional. “Eu decidi empreender em 2019, com tudo que isso implica. Encontrei uma abertura importante no Sebrae, que facilita muito pra gente. Comecei através do Empreende Afro. Nós conseguimos montar um coletivo chamado Nosso Ilê, formado só por afro-empreendedores”, afirma.

O grupo, segundo ela, fortalece o atendimento das demandas e das dificuldades enfrentadas. “Empreender é uma coisa, para o empresário afro, empreender é outra totalmente diferente. Você lida com muitas vertentes, outros problemas que o empreendedor, enquanto pessoa branca, não tem. O apoio do Sebrae foi muito importante pra gente”, ressalta.

Ela também destaca o apoio da instituição na questão de gênero. “Enquanto mulher LGBT me sinto parte dessa comunidade, então ter esse espaço também é muito importante, porque você mostra que o seu negócio é um espaço que abraça essa causa, onde as pessoas podem se sentir seguras. Então o Sebrae também traz muito isso, porque mostra as diferenças de cada empreendimento, de cada forma de atuar e os vários nichos”, diz.

Parceria

Dona de uma culinária e de uma personalidade marcantes, a chef diz que o restaurante é um reflexo direto do que ela pensa sobre alimentação. “O meu negócio mostra exatamente aquilo que eu sou e que eu entendo sobre esse ramo”, afirma. Foi pensando assim que ela resolveu apostar numa parceria que viabilizasse o funcionamento do espaço.

“O restaurante funciona de forma colaborativa. O Odara durante o dia, no almoço e, à noite, o Tamarineira. A parceria surgiu pela necessidade que a gente tinha de estar em um espaço maior, melhor localizado. Resolvi apostar no formato junto com uma pessoa que também já era da área de gastronomia, que queria voltar a atuar como espaço físico no pós-pandemia”, explica.

No novo sistema, os dois empreendimentos partilham o espaço de atendimento, a mesma cozinha, em horários diferentes. “Para adequar todas as despesas, nós dividimos as contas fixas e o restante fica cada um com o seu, mas juntando em momentos específicos, como em alguns eventos e algumas outras parcerias. Foi assim que surgiu a colaboração entre o Odara e o Tamarineira”, completa.

Cardápio

O menu do Odara traz ingredientes e texturas que ressaltam a influência da cultura africana e afro-brasileira. “A gente conseguiu incluir o Kelewele, um prato típico de Gana, país que é famoso pela comida de rua. Outro destaque é o acarajé, também ícone dessa mistura de culturas. São comidas que costumam ser vendidas em carrinhos, no melhor estilo street food, bem práticas, no espírito pega e sai comendo”, diz.

A inspiração é a comida típica das periferias de países como Gana, que guardam muitas similaridades com o Brasil. “O pessoal fritando a banana da terra temperada com especiaria e melaço, torrando o amendoim, que é colocado no papelzinho e você sai comendo depois do seu trabalho, tomando uma cerveja ou alguma bebida típica de lá. A proposta é apresentar essa comida de rua, que é tão famosa dentro da cultura da alimentação afro e afro-brasileira”, explica.

O amor pela cozinha nasceu na infância. “A gente aprende a fazer bem com tão pouco. Minha mãe sempre foi mestra em fazer isso, as mulheres da minha família em geral. Foi quando comecei a entender o que é realmente o alimento, que pra ele ser bom e bem preparado não precisa de muita coisa, precisa sim conhecer e entender como fazê-lo”, explica.

O Sebrae ajudou desde a formatação do plano de negócio, já que antes mesmo de abrir o restaurante, Ivanilda havia participado de cursos e mentorias. “Decidi abrir meu restaurante em 2020, só que aí veio a pandemia e foi mil vezes mais difícil. E foi o momento que eu mais precisei do Sebrae também, e pude contar de uma forma assim maravilhosa”, diz.

Nessa época, a futura empresária participou de grupos que foram formados especificamente no período da pandemia, com aulas on-line, reunindo pessoas que tinham as mesmas dores e os mesmos desafios a serem vencidos. “Eram pessoas com a mesma vivência, problemas e demandas. E o Sebrae apoiou totalmente. Um ano depois, quando abri o Odara, eu já estava com essa mentoria feita”, completa.

O carro chefe do Odara é o acarajé, o primeiro prato que a chef Ivanilda pensou para o cardápio do restaurante. “Eu já fazia esse prato e por isso resolvi chamar de Acarajé da Luz, porque era assim que ele já era chamado pelo pessoal da mídia, graças à jornalista Nide Lins”, diz.

Apesar dos desafios constantes, Ivanilda Luz continua sua luta como empreendedora e defensora da cultura afro-brasileira. “Nós vivemos num país ainda muito intolerante em relação às religiões de matriz africana. Ainda enfrentamos muito preconceito. Ter um negócio, um espaço que é voltado para essa ancestralidade, pra esse axé, não representa apenas um negócio. Além das dificuldades enfrentadas por todo empreendedor, ainda temos que lutar contra essas visões racistas”, resume.

O propósito, portanto, além de cozinhar bem e administrar o negócio, é levar mais conhecimento sobre o tema. “Quando apresento o prato, explico o meu cardápio, e conto a história dele, as pessoas entendem que comida é essa, de onde ela vem e adquirem mais informação sobre a nossa cultura. Enfrento o preconceito trazendo mais conhecimento para a mesa”, completa.